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A partir de G.O.L.P., do TEP & Teatro La Maria



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Zeitgeist, palavra alemã, significa espírito do tempo: atitudes, crenças, ideias e práticas culturais dominantes em determinado período histórico. É um modo de descrever a atmosfera intelectual e cultural de uma época ou geração e que influencia esferas da vida como arte, política, economia, religião e ciência, moldando tendências e direções que uma sociedade pode tomar em algum momento.


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Uma filósofa diz que a cultura pós-moderna é marcada por superficialidade e consumo, influenciando nossa forma de vivenciar emoções. Ela argumenta que as emoções são mercantilizadas em produtos culturais e padronizadas pela cultura de massa, levando a uma experiência emocional mais homogênea e limitada. No entanto, ela acredita ser característica do afeto resistir às nomeações – e palavras – que tenderiam a etiquetar, a simplificar, a padronizar, a coisificar, repertórios de sentimentos e sensações que escapam ao nome.


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Um exemplo da interpassividade do próprio artista pode ser observado quando ele insere no espetáculo uma crítica à natureza alienante da sua própria peça. Ao se tornar o foco de suas próprias piadas, o artista parece buscar proteção contra críticas externas, antecipando-as. Esse ato pode ser visto como uma forma de esquivar-se de suas responsabilidades, ao denotar uma postura cínica que esconde em aparente brincadeira uma questão séria.


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Ucronia é uma das etiquetas que classificam o espetáculo G.O.L.P. no sítio.


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Sou uma viajante perdida no mar de informações, afogada por ondas incessantes de dados que me arrastam. Sou levada sem direção por correntes imprevisíveis de notícias e ruídos. A tempestade de palavras me envolve, machucando minha lucidez e me impedindo de pensar. As questões deste momento parecem vastas, e as vozes discordantes tornam difícil ouvir qualquer princípio de verdade. Tento escapar das armadilhas das opiniões, mas sua inundação me arrasta de volta, impedindo qualquer fiapo de compreensão. Busco um sítio para descansar meus olhos, onde a paragem me permita assentar minha mente, mas sinto-me cansada, e não é simplesmente um cansaço.


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Revolução é uma das etiquetas que classificam o espetáculo G.O.L.P. no sítio eletrónico do Teatro.


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Querido sobrinho, idealizar o comunismo assim pode ser um tanto perigoso, pois ignora os desafios e contradições que já vimos em tantas tentativas de implementação do comunismo pelo mundo afora. Você me enviou a sinopse e não me disse nada sobre o espetáculo. Conte-me algo. Sobre essa sinopse, tenho de dizer que parece que resolveram transformar um tema denso em algo que caberia em um meme. A tia sabe o que é um meme. Se o espetáculo pretende abordar as crises sociais chilenas de forma jocosa, fico curiosa para saber se essa abordagem te fez rir ou deixou com uma boa ressaca!


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O teatro, em grande parte da sua história, tem sido uma forma de arte que convoca a participação do público, seja através da identificação entre ele e as personagens, seja através da reflexão suscitada pelos temas apresentados. A forma dramática pode gerar um envolvimento tal da espectadora na ação que sua atividade acaba sendo consumida, apresentando o ser humano e o mundo como instâncias imutáveis. Já uma forma épica do teatro incitaria a atividade da espectadora, convocando-a a uma conscientização do que é posto diante dela.


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O teatro interpassivo subverte a tradição de um teatro épico, aquele que estimularia o pensamento crítico e o engajamento da espectadora, promovendo em seu lugar a passividade e aceitação acrítica. Mas de onde viria essa passividade? Da artista? Da espectadora? Das financiadoras daquele espetáculo? Do zeitgeist?


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O Ministério da Saúde – do Brasil – adotou a linha de argumentação da ministra da Igualdade Racial. Expressões como “a coisa tá preta”, “denegrir”, “esclarecer”, “humor negro”, dentre outras, devem ser evitadas. A expressão “humor negro” pode “embutir uma ideia preconceituosa, visto que associa algo fora do padrão de normalidade inclusive a pessoas negras”. O texto sugere substituir “humor negro” por “humor ácido”. “A coisa tá preta” seria uma forma de associar “a pessoa negra a coisas ruins”, e deve ser trocada por “a coisa está complicada” ou “o caso é complexo”. “Esclarecer” seria outra expressão racista por “transmitir a ideia de que a compreensão de algo só pode ocorrer sob a claridade, mantendo na dúvida e no desconhecimento as coisas negras”. O texto sugere o verbo “explicar” ou “elucidar”.


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O fluxo do feed continua, e embora as imagens mudem, tu permaneces a mesma, mais cansada a cada nova imagem.


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O conceito de interpassividade foi introduzido por uma teórica cultural para descrever o fenômeno em que as pessoas delegam sua participação ativa a produtos culturais, mantendo a ilusão de estarem engajadas. Isso ocorre por meio da externalização da experiência de agir ou participar ativamente, substituindo-a por formas de consumo passivo, como assistir a filmes, peças teatrais ou consumir mídia digital. A autora argumenta que o capitalismo não exclui certo tipo de anticapitalismo. Filmes que encenam o nosso anticapitalismo para nós nos autorizam a continuar consumindo impunemente. Contanto que acreditemos que o capitalismo é mau, somos livres para continuar a troca capitalista.


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No dia seguinte ao espetáculo, telefonei para minha tia historiadora que, além de ter lutado contra a ditadura brasileira, colecionava artrópodes. Compartilhei a sinopse do espetáculo e pedi que ela escrevesse algumas impressões que a sinopse de G.O.L.P. lhe provocou. Antes de terminar a ligação, ela falou sobre o perigo de nos considerarmos protagonistas de uma história já escrita e finalizada. Ela me alertou sobre o ilusório privilégio de pensar que aquilo que sabemos está estabelecido e é imutável. Anotei mal suas palavras: “A ilusão do privilégio / pensamos conhecer a história / como universal, e não contexto-dependente.”


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Melancolia é uma das etiquetas que classificam o espetáculo G.O.L.P. no sítio eletrónico do Teatro Municipal do Porto. Infelizmente.


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Já o estado de espírito seria algo como o humor ou a disposição emocional de uma pessoa em um momento específico, sendo influenciado por fatores como eventos recentes, expectativas, experiências passadas e, em especial, o ambiente ao redor. Ele pode variar entre contentamento e irritação, por exemplo, e é transitório ao longo do dia ou das situações. Manter um estado de espírito positivo, disseram, é importante para a saúde mental, pois afeta a forma como a pessoa enfrenta desafios e adversidades.


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Golpe é uma das etiquetas que classificam o espetáculo G.O.L.P. no sítio eletrónico do Teatro Municipal do Porto. Infelizmente, não é possível aceder à etiqueta.


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Estávamos na proximidade do teatro e bebíamos um copo antes do espetáculo. Falávamos que as categorias artísticas servem mais ao mercado do que à arte e às artistas. Foi quando ela lembrou de um parágrafo de um romance específico, dizendo que aquele parágrafo a deixou há quase vinte anos completamente fascinada, foi essa a palavra, ela disse fascinada, sem saber o que pensar, meio confusa, ela bebeu o último gole do copo e disse: “eu só queria escrever um romance que conseguisse prolongar esse fascínio nas minhas leitoras”.


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ESPECTADORA – Passaste mal durante a apresentação? ESPECTADOR – Tomei meu medicamento a meio da peça. Deu para ver? ESPECTADORA – Não incomodou, mas fiquei preocupada. ESPECTADOR – Fiquei preocupado de perder o fluxo... ESPECTADORA – De informações?... ESPECTADOR – Também. Achas que incomodei o elenco? ESPECTADORA (rindo) – É mais fácil o elenco ter te incomodado. Saíram do teatro em direção ao restaurante habitual. ESPECTADOR – Dois copos de vinho branco? ESPECTADORA – Uma garrafa! ESPECTADOR – A atuação ficou mais dramática com o passar da peça, não ficou? ESPECTADORA – Já não acreditava em quase mais nada ao final. Mas o que seria uma atuação dramática? ESPECTADOR – Um profundo amalgamar entre atrizes e personagens. ESPECTADORA – Não pensei em drama, as personagens pareciam apenas um pretexto para as dramaturgas falarem aquilo que desejavam. ESPECTADOR – E lembras o que elas queriam falar? ESPECTADORA ri.


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ESPECTADOR – Não entendo. Não te provoca nada? ESPECTADORA – Só ecoa o que todas já dizem. ESPECTADOR – Dê um exemplo. ESPECTADORA – Como começar uma conversa com a palavra capitalismo? ESPECTADOR – Percebo. ESPECTADORA – Palavras grandes, pesadas, não iniciam conversas, apenas me deixam sem fala. ESPECTADOR – E o teatro? ESPECTADORA – O teatro às vezes aumenta a distância entre mim, espectadora, e qualquer caminho através dos sentidos impregnados pela dinâmica social. Sabes? ESPECTADOR aproxima uma mão da outra, sobrepondo os dedos indicadores e médios de ambas as mãos de modo a fazer aquele sinal. ESPECTADOR – Como chama esse sinal? ESPECTADORA – Sustenido? ESPECTADOR – Jogo da velha? Mas, o nome certo? ESPECTADORA – Jogo da velha?! Por que velha? ESPECTADOR – Tem outro nome, no Instagram tem outro nome. ESPECTADORA – Para de falar do Instagram! Não tenho Instagram, não quero saber de Instagram, tudo é Instagram! ESPECTADOR – Hashtag! É isso! ESPECTADORA – E ainda por cima em inglês! Vai conversar em inglês agora? ESPECTADOR – Era esse o nome! ESPECTADORA – Esse símbolo não é hashtag. ESPECTADOR – Atualmente é. ESPECTADORA – Era um botão nos telefones antigos. ESPECTADOR – Sabe o que significa? ESPECTADORA – Traduzindo, hashtag significa etiqueta. ESPECTADOR – Nunca tinha pensado nisso. ESPECTADORA – Teatro de etiqueta, ética quieta... não gosto, Marco, não gosto dessa conversa.


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Enquanto o estado de espírito é uma forma de descrever o humor ou a disposição emocional de uma pessoa em um momento específico, o zeitgeist refere-se ao espírito cultural e às tendências predominantes de uma era ou geração. Ambos estão relacionados a estados emocionais e culturais, mas em diferentes níveis: um é individual, o outro é coletivo.


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Destaco, sobrinho, outro ponto que considero mais delicado. Embora não tenha visto o espetáculo, apenas respondo ao seu pedido de comentar o parágrafo que você me enviou. Chamaria a atenção para a possibilidade de banalização do sofrimento humano e da própria experiência da ditadura, mas não consegui ir além do termo "comédia negra", ele também te incomoda?


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Dentro, era como se eu estivesse presa no Instagram. O grande palco do teatro encenava a correria desenfreada de um feed interminável, a sugar minha atenção, minar minha saúde e cansar minha vista já tão frágil. Estava diante de uma cena em feed, uma verticalidade tombada sobre o palco que me alimentava compulsoriamente. E nem sequer tinha fome, jantei antes de entrar no teatro. A cena me deixava confusa, fluxo incessante e esmagador. Você, espectadora, ouvirá falar de tudo um pouco, pois esta é a febre do nosso tempo, e eu, artista, estou aqui para revelar essa realidade com toda a sua intensidade dramática, ou seja, para te dizer que não há mais alternativas.


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Comunismo é uma das etiquetas que classificam o espetáculo G.O.L.P. no sítio eletrónico do Teatro Municipal do Porto. Infelizmente, não é possível aceder à etiqueta a fim de perceber sobre qualquer especificidade que.


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Caminhamos em direção ao teatro. Noite de estreia. “É difícil encontrar o bilhete com tantas aplicações abertas”, ela disse. “Preferia os bilhetes de papel”, pensamos. E enquanto eu mastigava uma pastilha elástica sabor a gengibre combinado com um toque ácido de limão, pensei se a peça que estava prestes a assistir consideraria o meu estado de espírito, quero dizer, se consideraria o espírito cultural de nossa época. Talvez tudo o que eu precisasse era ser arrancado do feed deste agora, como quem é privado de consumir aquilo que consome quase sem consciência. Mas será papel da arte oferecer resistência às aderências e aos vícios que temos na vida?


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A sinopse sugere uma abordagem simplista dos conceitos de ditadura e revolução, meu sobrinho, deixando de lado as nuances e dilemas morais que permeiam esses temas. Imagino que uma narrativa que não apresentar essas complexidades correrá o risco de distorcer a compreensão dos eventos históricos e das experiências humanas envolvidas. É crucial lidar com esses assuntos com profundidade e seriedade para não reduzir os significados e implicações dessas situações na história. Mas a tia está sendo chata. A tia acha que está sendo repetitiva demais.

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Esta peça é uma comédia negra que apresenta uma ucronia, na qual um grupo de chilenos viaja a Portugal, que se converteu na nação comunista mais bem-sucedida da história, com a finalidade de pedir ajuda para implementar este modelo de governo na América do Sul e conseguir, finalmente, uma constituição que possa levar tranquilidade a um Chile assolado pelas constantes crises sociais e pela perda de identidade. É uma reflexão sobre conceitos como ditadura, revolução e paz numa sociedade preocupada com o sucesso desmedido, com as sondagens, com o avançar rumo ao futuro sem se responsabilizar pelo passado e sem valorizar os sacrifícios que significou a luta contra uma ditadura, e o seu impacto na vida quotidiana.


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# tem vários nomes dependendo do contexto e da região. Em notações musicais, é chamado de sustenido e eleva uma nota em um semitom. Nas redes sociais, é a hashtag, usada para categorizar tópicos. Na programação e computação, é o hash, usado para comentários. Em algumas regiões, especialmente em Portugal e no Brasil, é chamado de jogo da velha ou jogo do galo, um passatempo jogado em dupla ou com o Google, por exemplo.


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PROGRAMA DE ESCRITA

Diogo Liberano assistiu ao espetáculo G.O.L.P. no dia 4 de abril de 2024, às 19h30, no Teatro Rivoli – Teatro Municipal do Porto; do dia 17 a 22 de abril, escreveu uma versão desse texto que foi lido com Gustavo Colombini no dia 22; de 22 a 24 de abril, o texto foi comentado por Colombini; por fim, em 24 de abril, os dois finalizaram juntos esse texto.


 

G.O.L.P.

Direção: Gonçalo Amorim, Alexis Moreno | Dramaturgia e texto: Alexis Moreno | Tradução e revisão: Tereza Afonso, Mariana Afonso, Maria João Machado | Revisão final: Filomena Louro | Interpretação: Alexandra Von Hummel, Pedro Vilela, Manuel Peña, Patrícia Gonçalves, Alexis Moreno, Gonçalo Amorim | Direção plástica: Catarina Barros | Desenho de luz: Alfredo Basaure | Luz: Francisco Alves | Direção de produção: Patrícia Gonçalves | Produção executiva: Abigail Raposo | Coprodução: Teatro Municipal do Porto, Teatro La María

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